MANHUAÇU- As mulheres estão alcançando seu espaço em diversas áreas e no esporte não tem sido diferente. E no futebol não é diferente, além do show com a bola nos pés, o apito nas mãos também tem se revelado um espetáculo à parte. Quando se fala em arbitragem, na região, o nome de Liliane Lopes Araújo é bastante conhecido. A presidente da Liga Esportiva de Manhuaçu sempre foi apaixonada pelo esporte e já conquistou seu espaço, quebrando barreiras e demonstrando todo seu conhecimento técnico.
Em entrevista ao DIÁRIO, Liliane se recorda que sempre militou na área esportiva e estudava no Colégio Tiradentes de Manhuaçu, onde tinha acesso a várias modalidades esportivas. Assim, teve a oportunidade de praticar vôlei, handebol, peteca e atletismo, por exemplo.
Mas, um diálogo foi decisivo para que ela buscasse novos voos e iniciasse na arbitragem. “Sempre joguei representando o município, chegou um ponto que a condição física não dava mais e a questão de trabalhar, além de praticar uma atividade física. Uma pessoa de Manhuaçu, Maria Camilo, falou: ‘Liliane, acredito que você dê para bandeirar, vamos bandeirar um jogo lá para mim’. Eu já trabalhava com ela dentro do Departamento de Esportes, na época e comecei. Auxiliei um jogo, gostei, todo mundo gostou e começamos a trabalhar dentro da área de arbitragem de futebol, vôlei, peteca. Eu tinha tudo para ser uma estatística ruim na minha comunidade, pelo meio e o esporte foi uma das ferramentas que me colocou hoje ser alguém, não alguém importante, mas alguém que é um esteio da família através do esporte”.
Questionada sobre o jogo que mais lhe marcou, ela cita um convite para a final do Campeonato do Açúcar, em 2016. “Um amigo nosso de Viçosa, estava tendo um problemão entre os clubes lá e o dono dessa competição falou com ele: ‘Estou com um problema, não sei quem escalo para esse jogo’. E ele respondeu: ‘Ouvi falar uma vez que teve uma menina que fez uma final do Açúcar ano passado aqui e foi muito bem. Nesse dia não me esqueço, estava num rio pescando e escutando essa final desse jogo, todo mundo elogiando essa menina pelo rádio, falando que ela estava indo muito bem. Traz ela’. Mas, parece que o outro ficou meio assim, um jogo problemático colocar uma mulher”.
Liliane foi confirmada como árbitra da partida e afirma que sua chegada provocou reações de surpresa. “Nesse jogo, o cara que me convidou, me trouxe, pegou minha bolsa e falou: ‘Todo mundo vai achar que eu que vou apitar’. Normal, entramos para o vestiário, que era um pouco abaixo do solo do campo. Estava aquele batuque, quando eu saí do vestiário e entrei para dentro do campo, todo mundo reagiu com surpresa: ‘É uma mulher que vai apitar’. Então, aquele jogou me marcou muito por tamanha responsabilidade e impacto para aquela cidade pequeninha, Jequeri, tendo uma mulher apitando. O jogo nos primeiros cinco minutos ainda fiquei um pouco nervosa, mas, depois, acalmou a adrenalina. E saber que o trabalho bem feito, com dedicação, profissionalismo, tem resultados é gratificante”.
Conquistando seu espaço e com ele o respeito. Liliane afirma que a atividade exige disciplina e dedicação. “Graças a Deus, dentro da nossa região aqui a minha agenda já está toda preenchida até o final do ano, porque já conquistei o mercado. O mais difícil às vezes no mercado é você até mantê-lo, porque a idade vai passando, tem que se dedicar, fazer curso, ter um profissional de educação física acompanhando, um psicólogo. É todo um trabalho e quem vê um árbitro entrando em campo, acha que ele só pega o apito e vai lá, você mexe com a paixão das pessoas e as pessoas agem pela emoção, não agem pela razão. É uma profissão, apesar do Brasil não ser, mas a gente trata como uma profissão, que você tem que ter realmente um gosta por aquilo”.
Ela frisa que além do financeiro, é preciso pensar como algo que se tem o prazer de atuar. “Se for primeiro pelo dinheiro, você não vai, porque você vai em campo bom e campo ruim, em campo com segurança e sem segurança. E a arbitragem hoje, infelizmente, no País se tem essa visão errônea que o árbitro vai lá para roubar para o time A ou B. E primeiro você tem que ir porque gosta”.
A LIGA
Liliane assumiu a Liga Esportiva de Manhuaçu há um ano e seis meses. Ela faz um balanço desse período e dos desafios enfrentados. “Então, é outra coisa complexa também, porque quando você mexe com uma coisa sua, empresa, tem que ter uma situação. Quando você mexe com uma coisa pública, tem que ouvir opiniões, nem sempre pode fazer o que você acha, tem um colegiado, uma diretoria pra isso. E às vezes você tem que tomar pancada por uma coisa que não concordou, a gente tem toda uma legislação no nosso futebol, no nosso caso, nossa Liga é filiada à Liga Amadora do Estado. E, hoje, nosso País passa por uma situação complicada financeiramente falando e nossos desportistas têm um defeito muito grande, eles não conhecem leis, só querem saber da bola rolando. Quando peguei a Liga, que tive a ideia de me colocar à disposição para regularizá-la, já começamos com um problema porque tinha uma dívida não de coisa que roubou, mas, de declarações de imposto de renda, por exemplo, que não fizeram. Isso trouxe um gasto pra Liga, então, primeiro passo, tivemos que colocar financeiramente ela em dia; segundo passo a parte de documentação, que tinha sido dada meio que uma baixa na Federação e essa parte organizacional foi muito difícil. Tanto que esse ano que começamos a fazer a divulgação dela e deixar mais em dia”.
O trabalho foi intenso e a presidente enfatiza os planos de fidelizar algumas parcerias, para novos projetos da Liga. “O sistema, seja ele público, não tem tanta credibilidade, as pessoas não querem pegar compromisso daquilo que elas não veem financeiramente resultado. Então, tivemos uma dificuldade para fazer essa diretoria, mas, conseguimos montar, onde hoje dentro de Manhuaçu a Liga é toda registrada, tem documentação, pode fazer convênio com o município e estamos atrás de parcerias com os governos estadual e federal. Não adianta falar de esporte, sem orçamento. Outra situação que estamos tentando fazer com que as pessoas entendam, não é porque é futebol que tem que ser desorganizado, de qualquer maneira. Queremos pessoas que realmente acreditem que o esporte é transformador”.
O futebol amador é movimentado em toda a região, mas, ainda esbarra em algumas questões estruturais, como analisa Liliane. “Outro problema, não só em Manhuaçu, como em nossa região, que a maioria dos eventos são feitos pela prefeitura. E nem sempre as prefeituras têm condições técnicas de realizar o evento, porque para fazer um campeonato não é simplesmente chegar lá, dar uma bola, um troféu e pagar uma arbitragem. Tem várias coisas que é preciso ser dada atenção para fazermos um evento bacana. Para se ter uma ideia, em Manhuaçu ano passado foi feita uma competição e esse ano também, com cerca de 32 equipes. Para um município que não tem campo, só temos o estádio JK, outro campo no São Francisco de Assis e outro no Parque de Exposições. Às vezes é muito complicado para o secretário dissolver esse tanto de jogos, gerenciar essas coisas, porque não é só rolar a bola.”
Liliane afirma que a Manhuaçu tem um povo apaixonado por futebol e ela está empolgada com a possibilidade de novidades para o esporte, a partir do trabalho que tem sido realizado. “Agora temos a questão do Boston City, uma equipe profissional na cidade, um dos motivos também que voltou aquela vontade de colocar a Liga em dia, o Estado estaria voltado para nossa cidade com olhares de parcerias para nossos projetos sociais. Não que o Boston vá fazer projetos sociais somente, porque é uma empresa, um clube, mas que outras crianças poderiam ter esse sonho. São séries de coisas que precisam se juntar, para acontecer”.